Com um cenário em que as transações bancárias acontecem, em sua maioria de forma digital, bancos centrais ao redor do mundo buscam criar moedas digitais, que podem trazer benefícios tanto para o sistema financeiro de cada país como para os consumidores. E o Banco Central do Brasil não está fora dessa tendência. Em agosto de 2020, o BC organizou um grupo de trabalho para estudar a emissão de uma moeda digital brasileira. Essa iniciativa resultou na publicação das diretrizes do Real Digital, em maio de 2021.
Em março de 2023, teve início o projeto piloto do Real Digital, com uma série de testes em um ambiente simulado, que permite o registro de vários tipos de ativos financeiros.
Mas, afinal, o que é o Real Digital?
Trata-se de uma versão digital oficial da moeda brasileira, o Real, e será apenas uma forma diferente de representá-la. O Real Digital poderá ser convertido para qualquer outra forma de pagamento disponível – como depósito bancário convencional – e também utilizado para pagamentos do dia a dia.
O objetivo do projeto é que o usuário do Real Digital possa fazer pagamentos em lojas, seja por meio de seu banco, instituição de pagamento ou outra que venha a ser autorizada pelo BC, ou mesmo por meio do Pix. Ele também poderá transferir Reais Digitais para outras pessoas, transformar suas moedas digitais que estarão em custódia de um banco em depósito bancário convencional; e pagar contas, boletos e impostos. O objetivo é que a movimentação dos Reais Digitais seja feita da mesma forma que a do dinheiro depositado no banco.
Para que serve o Real Digital?
A moeda digital permite movimentar Reais que não existem fisicamente, o que resulta na diminuição de custos de emissão da moeda física e facilita a implementação de inovações tecnológicas. A expectativa é que a moeda possa ser operada em todos os métodos de pagamento já existentes, bem como se conecte a outros bancos centrais ao redor do mundo. A ideia é que ela seja um complemento do papel-moeda.
Confira os principais objetivos do Real Digital:
- Facilitar transações;
- Reduzir custos, como o da emissão de papel-moeda;
- Simplificar o rastreio do dinheiro;
- Incentivar a concorrência entre as instituições financeiras ao cobrar taxas menores para a realização de operações;
- Ajudar na inclusão de mais pessoas no mercado financeiro;
- Fomentar a inovação: será possível criar novos usos para a moeda dentro de sua estrutura digital;
- Agilizar as transações uma vez que as operações serão confirmadas em segundos, como ocorre no PIX;
- Mais segurança: a estrutura da nova moeda poderá usar tecnologias como a blockchain, considerada um dos meios mais seguros para realizar transações pela internet;
- Dar maior privacidade a dados, reduzindo ataques e fraudes.
Como vai funcionar o Real Digital?
Ficará a cargo do Banco Central produzir, regular e emitir a moeda, assim como faz com o papel-moeda. A moeda digital será distribuída por bancos, instituições financeiras e de pagamento. Assim como acontece com o papel-moeda, a política monetária será a base de sustentação do valor do Real Digital. Ou seja, quando o BC movimentar a liquidez da economia, com o objetivo de garantir a estabilidade do valor de compra do Real, a quantidade de Reais Digitais em circulação também será levada em conta.
O Real Digital será recebido por meio de códigos distribuídos pelo Banco Central. Esses códigos serão armazenados em uma carteira digital, que será oferecida por bancos e outros agentes autorizados pela autoridade monetária.
Quem pode usar o Real Digital?
A moeda digital terá dois formatos: um de atacado e outro de varejo. Ou seja, uma Central Bank Digital Currencies, que significa moeda digital emitida pelo Banco Central (CBDC) de atacado voltada apenas para transações de elevados valores. Elas normalmente acontecem entre participantes do sistema financeiro – bancos, cooperativas, instituições de pagamento etc – e, eventualmente, grandes empresas.
Já a CBDC de varejo é voltada para atender às necessidades de pagamento e liquidação de indivíduos e empresas de todos os portes, podendo ser utilizada para pagamentos e para operações financeiras cotidianas em quaisquer faixas de valores. Isso significa que qualquer brasileiro ou empresa poderá usar o Real Digital. Lembrando que é preciso estar conectado à internet para ter acesso à moeda digital.
Será possível utilizar a moeda sem ter uma conta no banco. Porém, o Banco Central considera importante a parceria com o setor privado como forma de proporcionar liquidez ao mercado. Portanto, prevê a coexistência entre o Real Digital e moedas privadas emitidas por instituições reguladas em plataforma de pagamentos inteligentes.
Outra solução é que as instituições financeiras possam transformar os depósitos que recebem em tokens capazes de oferecer novos serviços prestados na plataforma desenvolvida para a operação do Real Digital.
Quando o Real Digital será lançado?
Segundo informações do Banco Central, o planejamento prevê o lançamento do Real Digital até o final de 2024. Somente a partir daí a moeda poderá começar a receber depósitos tokenizados – ou seja, será possível a conversão de ativos reais para digitais.
Os ativos que serão usados no projeto piloto serão:
- Depósitos de contas de reservas bancárias, de contas de liquidação e da conta única do Tesouro Nacional;
- Depósitos bancários à vista;
- Contas de pagamento de instituições de pagamento;
- Títulos públicos federais.
O projeto piloto conta com a participação de instituições autorizadas, com acesso direto a contas e passivo digital do BC; além de usuários simulados, por meio de depósito tokenizado; e a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que irá emitir títulos públicos federais e liquidá-los por meio de uma conta de pagamento.
O Real Digital é uma criptomoeda?
A moeda digital terá uma classificação de Central Bank Digital Currency (CBDC), o que significa, em uma tradução livre: moeda digital do Banco Central. Ou seja, ela é uma moeda pública e transacional alternativa, e não uma criptomoeda.
Diferentemente desses ativos, as criptomoedas passam por mineração, são privadas e não são reguladas por Bancos Centrais. Além disso, a natureza das moedas virtuais é ser um ativo. Portanto, ela não tem todas as características fundamentais para ser considerada também uma moeda, como a possibilidade de ser usada como meio de troca, reserva de valor e também unidade de conta.
Além disso, as criptomoedas, como bitcoin e ethereum, possuem uma grande volatilidade, o que dificulta seu uso como meio de pagamento. Já criptomoedas da categoria de stablecoins buscam corrigir esse problema atrelando seu valor a algum ativo de fora do ambiente cripto, em geral a uma moeda soberana. Nesses casos, os detentores desses ativos enfrentam riscos operacionais, jurídicos e também de mercado.
Por sua vez, o Real Digital é uma expressão da moeda soberana brasileira. Em um ambiente seguro, empreendedores poderão implementar inovações enquanto os consumidores poderão ter acesso às vantagens tecnológicas trazidas por essas ferramentas.
Quanto valerá R$ 1 digital?
O Real Digital terá o mesmo valor do dinheiro real. Ou seja, R$ 1 será equivalente a R$ 1 digital. O objetivo é que seja apenas uma forma de representação diferente da moeda original.
Qual a diferença do Real Digital para o PIX?
Enquanto o PIX é um sistema de pagamento já em vigor no país, o Real Digital será uma moeda alternativa, ainda em implementação. Portanto, ela irá coexistir com o PIX, e não anulá-lo. O PIX é uma operação eletrônica instantânea. Já o Real Digital não é uma operação, mas, sim, uma moeda.
O PIX precisa ser intermediado por bancos, enquanto que o Real Digital não terá de passar, necessariamente, por essa autenticação: bastará que esteja incluído em uma carteira digital para que seja transacionado, como ocorre com as criptomoedas.
Outra diferença entre o Real Digital e o PIX é a seguinte: como uma moeda, a CBDC poderá ser usada em larga escala, inclusive em operações entre grandes empresas e instituições financeiras. Já o PIX pode ser operado somente entre pessoas físicas, empreendedores e pequenas empresas.
O que é o PIX Offline?
Essa funcionalidade ainda está em desenvolvimento. Neste caso, as transações via Pix poderiam ser feitas mesmo em locais que estejam sem conexão com a internet. Essa informação foi confirmada pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Para que a funcionalidade seja possível, são estudadas três alternativas: a mais segura é o uso de um cartão com aproximação, que poderá ser carregado pelo usuário.
Vantagens do Real Digital
Uma das vantagens do Real Digital é que ele reduzirá a emissão de papel-moeda. Além disso, também poderá ser usado em qualquer lugar do mundo. Ou seja, não haverá necessidade de que seja convertido em outras moedas, já que o pressuposto é que tenham a mesma cotação.
Assim como o PIX, o Real Digital poderá ter a capacidade para realizar operações on-line e, eventualmente, transações offline.
O Real Digital também irá inibir a lavagem de dinheiro, pois as operações serão rastreadas.
Pagamentos e remessas internacionais de pequenos valores, que hoje são em muitos casos inviabilizados devido aos custos de transação, poderão se tornar ágeis e baratos.
Outra facilidade é permitir a criação de contratos inteligentes. Ou seja, será possível programar pagamentos em TVs ou realizar pagamento de pedágios de forma automática.
A nova moeda poderá ainda permitir a oferta de produtos personalizados a um custo não proibitivo. Esses produtos personalizados podem suprir necessidades de microcrédito de pequenas comunidades ou ampliar o acesso a contratos de financiamento personalizados que se adequem à geração de fluxo de caixa de pequenos negócios.
Por fim, será possível a criação de serviços financeiros geridos por um software com base no conceito de finanças descentralizadas (DeFi). A tecnologia permitirá, por exemplo, a realização de empréstimos entre pessoas, com cobrança de juros.